sábado, 22 de dezembro de 2012

Boas Férias, Boas Festas

 
 
Boas Festas para quem festeja,
Boas férias para quem as tem,
e um Bom 2013 para todos!
 
Até para o ano!
 
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 Comme une absence, Khomsa, Anouar Brahem
 

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Solidões

 
 
Five o'clock Tear
Coisa tão triste aqui esta mulher
com seus dedos pousados no deserto dos joelhos
com seus olhos voando devagar sobre a mesa
para pousar no talher
coisa mais triste o seu vaivém macio
p'ra não amachucar uma invisível flor
que cresce na penumbra
dos velhos corredores desta casa onde mora

Que triste o seu entrar de novo nesta sala
que triste a sua chávena
e o gesto de pegá-la

E que triste e que triste a cadeira amarela
de onde se ergue um sossego um sossego infinito
que é apenas de vê-la
e por isso esquisito

E que tristes de súbito os seus pés nos sapatos
seus seios seus cabelos o seu corpo inclinado
o álbum a mesinha as manchas dos retratos

E que infinitamente triste triste
o selo do silêncio
do silêncio colado ao papel das paredes
da sala digo cela
em que comigo a vedes

Mas que infinitamente ainda mais triste triste
a chávena pousada
e o olhar confortando uma flor já esquecida
do sol
do ar
lá de fora
(da vida)
numa jarra parada
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in A Palavra O Açoite (1977), Emanuel Félix
 
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Valsa para piano nº7, Op.64, F. Chopin (V.Ashkenazy)


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Salinas de Aveiro

 
Foi em tempos modo de ganhar o pão,
fonte de desenvolvimento, lugar vivido.
Hoje é uma paisagem perturbante de beleza,
silêncio e solidão.
 
 
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Jazz Suite Nr.2, Waltz 2, D.Shostakovitch, Royal Concertgebouw Orchestra
 
 
 


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A Árvore é Tudo


A árvore é tudo o que falta no céu
quando a contemplo.
Aconteceu há muito no recato
do meu livro de espantos e ternuras.
Tudo o que eu fizer, árvore,
será com a caligrafia dos teus ramos
bebedores de azul, da altíssima vibração
do azul na névoa das manhãs.
Ninguém conhece o teu perfil
quando os meus olhos não te alcançam
ou te desvias do meu corpo.
Os teus braços dizem berço e abraço
de outros braços de susto e perdição.
Por certo em teu redor dançaram maldições,
assobiaram pragas,  esconjuros.
Assim fazem os néscios a quem
dá sombra ao verão e lenha ao frio
e poiso às aves de qualquer estação.
Inúteis ameaças.
Em minha nuca a tua seiva escorre.
Árvore que eu invento nunca seca.
 
( in Os Sítios, Licínia Quitério, edição de autor)
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Valsa para piano nº7, Op.64, F.Chopin (V.Ashkenazy)



terça-feira, 27 de novembro de 2012

Lugar de descobertas e surpresas







Cidade viva, a criar arte,
a produzir beleza, a partilhá-la.
Soube bem estar em Guimarães!
 
 
 
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My shining hour, John Coltrane (Coltrane Jazz)
 


terça-feira, 20 de novembro de 2012

Mil vezes esta pedra


 
Mil vezes esta pedra, mil vezes este mar.
Mil vezes aqui estive e mil vezes voltei.
Saber de um tesouro que há-de haver.
Saber-lhe o brilho, o cheiro, a vastidão.
E não saber. Uma janela entreaberta,
um muro inacabado, um cabo por dobrar.
No fio da inquietação, uma batida,
um compasso de tempos muito antigos,
antes das grécias, dos dilúvios. Antes.
 
 
(in Os Sítios, Licínia Quitério, edição de autor)
 
 
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Valsa para piano nº7, Op.64, F.Chopin (V.Ashkenazy)


terça-feira, 13 de novembro de 2012

Urgência


 
ACORDAI!



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Sonata for piano nº2, (Funeral March), F.Chopin

domingo, 4 de novembro de 2012

Numa aldeia de granito, pela mão de uma amiga


Distraída, comecei por ouvir o som dos chocalhos, e senti-me recuar meio século, ao tempo das férias sem regras nem fim,
 em casa da tia Aurora.


Dobrei, pé ante pé, a esquina da casa, quase com medo de desfazer o salto no tempo,
 e encontrei-as a beber na fonte.


Depois, pachorrentamente, vieram elas  para a frente da casa,
 e ficámos a conversar como velhas amigas.

Ali estava a minha infância , intacta, à frente dos olhos!
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Time on my hands, Sonny Rollins and The Modern Jazz Quartet


quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Partilha de território


Ai que o Filhote já chegou! Eu devia ter desconfiado, com a DonaMinha a cantar por todos os cantos! Eu sei que tenho de ir cumprimentá-lo, mas sinto-me um pouco inseguro...
vou ali trocar impressões com o FazdeDono!

 
-Anda cá, FazdeDono, preciso de conversar contigo sobre esta difícil situação.
 Sei lá como é o Filhote, se fala gatês, se faz muito barulho, se sabe dar marradinhas.
Dá-me lá instruções, pois se o trato mal a DonaMinha nunca mais me perdoa!
Estou tão preocupado...

 
-Ciúmes? Disparate, são lá ciúmes, é apenas o desconhecimento da situação.
 Mas tu não percebes, também andas todo sorridente com ele!
Ora bem:respiro fundo, encho-me de coragem e vou lá cheirá-lo!


Ele há bocado parecia mais alto e assustador! E o cheiro é familiar!
Bom, vou aproximar-me - mas cautelosamente, pé ante pé, não vá haver surpresas ...
e também para não o assustar, claro!


Olha, olha, ele sabe gatês! E como teria adivinhado que eu gosto de festas na barriga?
 Deve vir nos genes...
RonRon, parece que temos amizade!


- FilhoteDela, toma lá uma marradinha como prova de confiança, mas para cimentar a nossa amizade vamos fazer um acordo: logo à noite na sala ficas com os sofás todinhos...
mas o colo da DonaMinha é só para mim!
 Combinado? RonRonRon...
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With a song in my heart, Sonny rollins with The Modern Jazz Quartet

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Protesto - III

 
 
Antes que seja tarde
 
 
Amigo,
tu que choras uma angústia qualquer
e falas de coisas mansas como o luar
e paradas
como as águas de um lago adormecido,
acorda!
Deixa de vez
as margens do regato solitário
onde te miras
como se fosses a tua namorada.
Abandona o jardim sem flores
desse país inventado
onde és o único habitante.
Deixa os desejos sem rumo
de barco ao deus-dará
e esse ar de renúncia
às coisas do mundo.
Acorda, amigo,
liberta-te dessa paz podre de milagre
que existe
apenas na tua imaginação.
Abre os olhos e olha
abre os braços e luta!
Amigo,
antes da morte vir
nasce de vez para a vida.
 
(Manuel da Fonseca)
 
 
Something I dreamed last night, Miles Davies
 

 


domingo, 7 de outubro de 2012

Protesto - II



De Semântica
 
 
Recentemente
na fábrica
melhoraram muito
as relações humanas.
Agora, por exemplo,
ao tirar-se o prémio semanal
a uma operária
por uma mistura de fios,
por exemplo,
ou por qualquer acto menor de indisciplina,
já não se diz impôr um castigo;
diz-se:
estimular o sentido
de responsabilidade.
 
(Miguel Martí i Pol)
(tradução de Manuel de Seabra)
 
 
Something I dreamed last night, Miles Davies
 

 


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Protesto - I


 
Canção dos que vivem das suas mãos
 
 
Não peço o de ninguém.
Apenas o meu pão,
meu ar.
 
 
 
Apenas a flor,
o fruto do que fazem minhas mãos.
 
 
(Jesús Lopez Pacheco)
(tradução de Egito Gonçalves)
 
 
Something I dreamed last night, Miles Davies
 


segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Tomateiro intrépido


Há tomateiros obstinados e decididos, que não recuam perante um caminho difícil.
Este nasceu em ambiente inóspito, contudo ali está ele, corajoso, a crescer erecto e digno.
Até já deu flor.
Assim alguns, mulheres e homens!
 
 
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Time on my hands, Sonny Rollins with The Modern Jazz Quartet


segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Junto ao Rio - II


O despojamento. A ousadia. O frémito da beleza.
 
 
A sobriedade. O desafio. O frémito da beleza.
 

Lugar de perplexidades e controvérsias,
de equilíbrios e sobressaltos.
O frémito da beleza
 
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Regard de mouette, Anouhar Brahem
 


terça-feira, 11 de setembro de 2012

Junto ao rio -I

 

Como uma provocação.
Como um navio que parte.
Como uma torre insubmissa.
Como um sonho inacabado, que ficou na margem
 
 
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E la nave va, Anouar Brahem
 


terça-feira, 4 de setembro de 2012

A idade não perdoa


Anda lá, Donaminha, vamos brincar às caçadas-faz-de-conta com a bolinha de plástico!

 
Ora para quê! Para me exercitar e não perder o jeito - vá, eu atiro ao ar e depois é a tua vez!
 


Não sei o que se passa, mas os pássaros agora voam mais depressa, e os ratos resolveram ficar da cor da noite...cada vez é mais difícil caçar!


Da idade? Tens cada uma, Donaminha!
Agora vamos descansar um bocadinho, está bem? Já caçámos muito...
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This love of mine, Sonny Rollins and the Modern Jazz Quartet

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

As ovelhas negras



Todas as boas famílias têm uma ovelha negra.
 Diz quem sabe que com frequência é o seu  membro mais interessante.
As aparências nunca serão, portanto, conclusivas?

(Vou retirar-me por uns tempos para reflectir com calma sobre esta inquietante hipótese)
Até breve!

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Can't we be friends?, Art Tatum



sábado, 28 de julho de 2012

AvóDezanove, Pi 3,14 e todos os outros


A infância, a ternura, a aprendizagem.
O sentido crítico, o humor, a lucidez.
O universo infantil, os adultos, a vida na cidade.
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Ondjaki, meu feiticeiro bom, quanta descoberta e quanto encantamento me proporcionaste no passeio pela PraiaDoBispo!
 E obrigada por mostrares que se pode encontrar poesia até num mundo quase a "desplodir"
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(AvóDezanove e o segredo do Soviético, Ondjaki, Ed.Caminho)

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This love of mine, Sonny Rollins and The Modern Jazz Quartet



domingo, 22 de julho de 2012

Objectos sem uso




Foram objectos de uso diário, indispensáveis ao quotidiano de uma casa de campo.
Hoje têm valor estético e o poder de me acordarem nostalgias de tempos perdidos.

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These foolish things, Charles Mingus




domingo, 15 de julho de 2012

A minha rosa-camaleão


Começa a vida em botões amarelo-salmão


Em adulta desdobra-se e passa a amarelo-canário


Só no fim da vida, antes de desfolhar, se pinta de cor-de-rosa


Tão parecida com algumas pessoas, a minha rosa-camaleão!


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Valsa nº10, Op.64, Chopin (V.Ashkenazy)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

A uma deusa desconhecida


Encontrei-a num jardim, a passear sozinha.
Saudei-a e logo se dispôs a brincar comigo ao jogo dos tempos remotos: fingiu esconder-se atrás do arbusto, como se este fosse a mais misteriosa das selvas, e fitou-me um momento com olhos frios e insondáveis.


Depois, com elegância e fingida deferência, enrolou-se-me aos pés, num malicioso e improvável gesto de ternura.
Pura sedução!


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I surrender, dear, Lionel Hampton

quinta-feira, 28 de junho de 2012

O tempo escultor


Está ali. Provavelmente está ali desde sempre.
O tempo apenas lhe foi burilando a forma, adoçando a face, compondo as cores.
Até a transformar num quase mistério.

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I wish I knew, John Coltrane Quartet

domingo, 17 de junho de 2012

Enquanto espero...


Entretenho-me a espreitar os improváveis campos desenhados em esquadria perfeita e coloridos com pinceladas exactas, que lá em baixo se me oferecem numa luz lenta e leve, enquanto, vagarosamente, me aproximo do abraço filial que aguardo há um ano...

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With a song in my heart, Sonny Rollins and the Modern Jazz Quartet






domingo, 10 de junho de 2012

Enigma

A reunião anual da família?
Uma manifestação contra o despotismo de Neptuno?

O passeio habitual das manhãs de domingo?
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Fiquei sem saber...
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Enigma, Miles Davies